domingo, 14 de setembro de 2014

O Sistema Educacional Não Funciona Mais

Excepcionalmente, permito-me postar um texto que não é de minha autoria, mas de um sociólogo francês - Michel Maffesoli - sobre a educação na atualidade. Trata-se de trecho de uma entrevista concedida por ele em abril p.p. ao jornal "Zero Hora". Penso que suas considerações merecem ser lidas.


ZH – No Brasil, temos uma discrepância entre o modo de agir e pensar dos jovens e o sistema educacional. Na sua visão, é preciso fazer uma grande ruptura nesse sistema?


MM – Eu penso que o sistema educacional é um sistema totalmente apodrecido, que não funciona mais. Eu não acho que haja uma reforma possível para a educação, mesmo as progressivas. Eu diria que a educação moderna, que havia antes, não é baseada em iniciação, e há uma diferença entre educação e iniciação. A educação, que vemos em universidades e instituições e funcionou bem durante a modernidade, é verticalizada. Enquanto que a iniciação é horizontalizada. A iniciação tem uma ideia de acompanhamento e encontra um ponto de ajuda justamente na internet. É um paradoxo pós-moderno. A educação de hoje encontra paralelo antropológico na ideia das tribos antigas, quando as pessoas eram iniciadas. Na pós-modernidade se volta para a iniciação, com a utilização da internet. As instituições educacionais estão coladas a uma ideia de verticalização: eu sei algo que você não sabe e eu estou passando conhecimento para você. Na iniciação, há uma horizontalização, como na wikipédia. A internet mostra que é assim que as coisas funcionam na pós-modernidade, com a ideia de compartilhamento.


ZH – No mundo do trabalho há também essa dificuldade de adequar jovens aos sistemas verticais?


MM – A hora-trabalho é uma ideia vertical e moderna, ao passo que hoje os jovens têm mais apego a questões ligadas à criatividade. É uma mudança de valores, uma questão da qualidade de existência. Não se quer mais perder a vida para ganhar a vida. Há uma dicotomia. Não querem mais perder a vida para ganhar a vida, não querem mais desperdiçar a vida para ganhar algo. Os jovens têm a ideia de transformar a sua vida em uma obra de arte. Esse é um dos cernes da diferença entre a modernidade e a pós-modernidade.


ZH – E como ficam as profissões mais tradicionais, em campos como Medicina, Direito e Engenharia? Há um risco de os jovens perderem o interesse nesse tipo de profissão?


MM – Numa perspectiva a longo prazo, passaremos a ver as pessoas tendo mais vidas dentro de uma mesma vida. A pessoa não terá mais uma profissão fechada. Dentro dessa ideia, existirá um alongamento da vida e, por isso, as pessoas poderão ter não só uma profissão, como advogado ou professor, mas transitarão mais. As pessoas não terão uma função, mas sim um papel. São questões pré-modernas que eu acredito que vão voltar. O sujeito não tinha uma função, mas um papel dentro do grupo.

ZH – Isso também pode se refletir na família?


MM – Sim, passa pela família. Não teremos mais famílias mononucleares, com um pai, uma mãe e as crianças. Isso se espalha também pela formação da família, pelas possibilidades de sexualidade. Serão novos modelos de família e, ainda dentro dessas famílias, novas maneiras de exercitar esses núcleos.


ZH – Como se preparar para lidar com duas visões tão diferentes de mundo, entre os jovens e os mais velhos? Não são visões de mundo conflitantes?


MM – Não acredito que vá haver um conflito tão intenso. Eu não penso que há um choque. Simplesmente, os mais velhos irão desaparecer progressivamente (risos). Eles vão morrer, e os jovens vão dominar a sociedade e carregarão esses novos valores. As próximas gerações serão as constituintes e as mais velhas irão caducar e desaparecer.
ZH – Então, não há caminho de volta?
 Não, não há  (rs).  Assim é a vida.


sexta-feira, 7 de março de 2014

No Dia internacional da Mulher

"Se temos de esperar,
 que seja para colher a semente boa
 que lançamos hoje no solo da vida.
 Se for para semear,
 então que seja para produzir
 milhões de sorrisos,
 de solidariedade e amizade".
 (Cora Coralina)

A qual mulher nos referimos, quando se trata do Dia internacional da Mulher?
Estaríamos pensando na dona de casa (que ainda existe nos meios mais simples) à qual ninguém dá muito valor, embora sua família seja alimentada e literalmente cuidada por ela em seu dia a dia?
Estaríamos pensando nas empregadas domésticas (hoje também se tornando raras) que cuidam de nossa infra-estrutura caseira enquanto nossas famílias tratam de suas atividades externas?
Estaríamos pensando nas professoras de ensino básico e médio que cuidam de nossos filhos instruindo-os para a vida?
Estaríamos pensando nas médicas que cuidam (tão bem ou melhor do que os homens) da saúde de todos nós em suas múltiplas especialidades?
Ou estaríamos pensando nas engenheiras, nas matemáticas, nas físicas que cuidam das ciências exatas  em quaisquer campos de pesquisa ou aplicação?
Poderíamos ainda estar pensando nas advogadas, nas filósofas ou nas sociólogas que cuidam dos 
âmbitos éticos e sociais desta vida... o âmbito das 'humanidades'...
Estaríamos pensando naquelas envolvidas na política e que ocupam as mais altas posições antes privativas dos machos? Estas cuidam mais dos próprios interesses, embora façam de tudo para garantirem o contrário. Afinal, política é a arte do possível (e a frase não é minha)!
Poderíamos ter em mente as especialistas em técnicas da informática, da informação ou da publicidade;
Poderíamos ainda estar pensando nas religiosas, nas enfermeiras, nas secretárias, nas garçonetes, nas costureiras, nas dançarinas, nas pintoras ou  nas livres-docentes das universidades;
Ou estaríamos pensando em nossas mães, qualquer que fosse seu campo de atividade?
O denominador comum é que uma mulher está sempre 'cuidando' de algo ou de alguém: porque é o 
que cada uma de nós sabe fazer melhor e quando não sabe, não está bem engrenada em sua condição feminina.
Podemos nos dar bem em qualquer atividade - até nas policiais e militares - mas o papel mais característico de nossa natureza: sim, isso existe, isso se define por nossos hormônios, por nossos óvulos, por nosso lado esquerdo do cérebro, pela rapidez de nossas respostas emocionais por mais racionais que possamos ser, por isso tudo nosso papel mais típico e nossa maior habilidade é a de cuidar de algo ou de alguém no exercício de qualquer coisa.
Sou uma mulher e assumo sem dificuldades o fato de que não sou melhor nem pior do que nenhum homem, mas sou diferente deste ser que pode me complementar, como eu a ele em sua forma de exercer as mesmas atividades.
Portanto, penso que a criatura à qual devemos nos referir e que merece ser homenageada, neste Dia internacional da Mulher, é aquela que procura ser boa no que faz, do jeito que a caracteriza, em seu 'jeito feminino de ser'.

Maria Antonieta de Castro Sá.
   
 

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Espiritismo mais acessível

Há algum tempo venho observando que a linguagem dos textos espíritas, principalmente os textos doutrinários, deixa a desejar no que diz respeito à clareza. Se Kardec cuidou, no estilo das perguntas e respostas, de fazer-se entender por seus leitores, grandes autores que vieram depois nos apresentam uma linguagem e um estilo rebuscados que não facilitam sua compreensão - inclusive autores recentes, o que é de se lamentar. É compreensível que no século XIX e início do século XX se escrevessem em estilos formal e erudito. Mas hoje,até pessoas de nível universitário comentam com frequência que precisam ler e reler vários autores espíritas, para compreendê-los. A Boa Nova é matéria bastante abstrata, convém lembrar. Esta não é uma boa razão para mostrá-la aos homens com a simplicidade que lhes favoreça uma clara percepção? Nosso mundo caminha rápido pelas mãos da tecnologia - e pelas mãos da economia de mercado cada geração é mais exigente que a anterior, no que concerne ao interesse imediato. Temos aí uma dupla de recursos que afasta o ser humano de propósitos evolutivos a longo prazo e que exijam esforço, desprendimento ou solidariedade. Quantas das pessoas que buscam as Casas Espíritas não o fazem com objetivos 'muito práticos' de terem suas dificuldades ou problemas sanados com a máxima brevidade possível? Quantas retornarão a uma próxima palestra, se a primeira que assistiram caminhar por trilhas de um estilo moralista que não deixa clara a sensibilidade pelas angústias da platéia? Jesus não se valeu à toa de parábolas, para dirigir-se aos que O seguiam cheios de dúvidas sobre as possíveis escolhas em suas caminhadas... Ele devia saber, certamente, que não era fácil a compreensão e a prática do que tinha a dizer e a mostrar em Seus próprios exemplos. E tantas facilidades ilusórias nos seduzem hoje, que, por mais razões, a mesma compreensão e a mesma prática continuam não sendo fáceis. A instituição da família periga esfacelar-se, atrás da filosofia das vantagens imediatas e das respectivas substituições igualmente imediatas. As instituições educacionais, com exceção daquelas patrocinadas pelas igrejas, tendem a abster-se de ensinos morais,senão pelos ensinos de diferentes interesses sociais. Poucas coisas são mais difíceis, nestes dias, do que explicar a um jovem o que se pretende ao recomendar-se 'o amor aos nossos inimigos', por exemplo. Nós, espíritas, precisamos atentar ao estilo e à linguagem com que nos dirigimos aos nossos leitores, ouvintes ou interlocutores em geral, se queremos de fato contribuir com a sobrevivência do planeta neste seu difícil período de transição.